terça-feira, 3 de outubro de 2023

Crise dos circuitos: a ressurreição cibernética

 


Escolas por todo o país estão a enfrentar uma avalanche de computadores avariados, que se amontoam em espaços improvisados como um exército de zumbis tecnológicos. Os directores, impotentes, clamam por técnicos informáticos que possam ressuscitar essas máquinas, mas a resposta é um eco ensurdecedor.

A situação atingiu o ponto de ruptura no Agrupamento de Escolas Cego do Maio, no Porto, onde mais de 70 computadores avariados encontram-se armazenados numa espécie de necrotério tecnológico. O director, Arlindo Ferreira, descreve a cena como algo saído de um filme distópico, com mochilas amontoadas em prateleiras, aguardando por uma intervenção divina que os traga de volta à vida cibernética. O presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares (ANDE), Manuel Pereira, confirma que esta é uma epidemia nacional: "Todos nós temos computadores já fora da garantia e há cada vez mais a avariar. Os computadores são cedidos pelo ministério e, quando não funcionam, os pais dirigem-se às escolas". E assim, as escolas tornam-se cemitérios de circuitos e chips desamparados. Nos corredores do Agrupamento General Serpa Pinto, em Cinfães, dirigido pelo próprio Manuel Pereira, estima-se que cerca de 30 a 40 computadores aguardam o seu destino final, guardados em locais improváveis.  E a saga continua no Agrupamento de Escolas Dr. Costa Matos, em Vila Nova de Gaia, onde outras três dezenas de máquinas avariadas esperam por um milagre tecnológico. Filinto Lima, director da escola e presidente da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP), relata a sua própria versão do pesadelo tecnológico. Muitos desses equipamentos já estão para lá da garantia, sublinham os diretores. Os primeiros 'kits' entregues aos alunos tinham uma garantia de dois anos, que expirou em 2022. E os equipamentos da Fase 2? A garantia terminou em abril de 2023. É como se fossem bombas-relógio, programadas para causar transtornos no momento mais inconveniente possível. E quando a garantia chega ao fim, a conta cai nos ombros das famílias. Uma professora narrou a triste história de um aluno cujo computador, entregue com pompa e circunstância, teve uma morte súbita da bateria poucos dias depois. O pai, desolado, recusou-se a pagar pela ressurreição, afinal, o equipamento pifou logo após o baptismo digital. O presidente da ANDE aponta uma solução: alargar as garantias dos equipamentos e providenciar meios para que as escolas possam resolver rapidamente estes problemas. Mas até agora, as promessas ficam no ar e os computadores continuam a acumular-se, à espera de um milagre tecnológico que os traga de volta à vida digital. Até lá, que os deuses dos circuitos estejam connosco.

 


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