Deve ficar nos anais da História da
Justiça em Portugal o “extraordinário discurso da Senhora
ministra da Justiça”, proferido, quarta-feira (29), na cerimónia
alusiva à abertura do ano judicial, escreve o advogado e docente
universitário Luís Menezes Leitão no seu blogue.
O jurista gostou especialmente da parte
em que a governante diz que “a taxa de resolução nas acções
executivas cíveis é superior a 190 por cento e a duração média
dos processos de falências, insolvências e recuperação de
empresas no âmbito do PER (Processo Especial de Revitalização) é
de dois meses, sendo possível aferir que 42,90 por cento destes
processos terminam por acordo”.
“Quer dizer”, assinala o advogado,
que, “neste momento, graças às miraculosas reformas efectuadas, o
sistema conseguiu o extraordinário prodígio de resolver quase o
dobro das acções executivas que tem”.
Quanto ao PER, dois meses é mesmo o
prazo previsto no artigo. 17º. - D, nº. 05, do CIRE para a
conclusão das negociações com os credores, sendo que depois
segue-se o processo de insolvência, se não houver acordo.
Dos números indicados pela ministra
resulta, assim, que em 57 por cento dos casos o processo de
revitalização foi completamente inútil, só servindo para atrasar
o processo de insolvência, adverte o professor universitário.
Já agora, acrescenta ele, por que é
que a ministra não diz quanto tempo dura, em média, um processo de
insolvência? E quanto tempo dura, em média, um procedimento
especial de despejo, depois do absurdo Balcão Nacional de
Arrendamento? E quanto tempo dura, em média, uma acção cível,
especialmente depois da disparatada reforma do Processo Civil? E, já
agora, um processo-crime?
Nada disso interessa, claro. Porque, opina ele, a
Senhora ministra está mais interessada em combater os polvos, os
ratos e os alegados especialistas (por esta ordem, que não por
outra).
“Contra os polvos, os ratos e os
alegados especialistas cá teremos, naturalmente, a heróica
governante, que nunca esmorecerá no seu combate”, ironiza o
articulista.
“Quanto aos operadores judiciários,
lá terão de a seguir, à força (...)”. “Há, pois, que seguir
os verdadeiros profetas, aqueles que acreditam nos gloriosos amanhãs
que cantam e que, por isso mesmo, cantam loas às maravilhosas
reformas”, acentua.
E conclui: “Que ninguém se atreva,
pois, a dizer que essas maravilhosas reformas se limitaram a reduzir
o Processo Civil a um vácuo normativo e que não deixarão pedra
sobre pedra de uma organização judiciária que levou séculos a
construir. Como diria Pangloss, em 'Candide ou o optimismo', tout va
pour le mieux dans le meilleur des mondes possibles”.
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